Publicado em 9 maio 2025
Interstitial Lung Disease A Review
Título do Estudo
Interstitial Lung Disease A Review
Fonte
Maher TM. Interstitial Lung Disease: A Review. JAMA. 2024;331(19):1655–1665. doi:10.1001/jama.2024.3669
Introdução
A Doença Pulmonar Intersticial (DPI) é caracterizada por inflamação e/ou fibrose no interstício alveolar pulmonar. Aproximadamente 30 a 40% das pessoas com DPI desenvolvem fibrose progressiva, que culmina em insuficiência respiratória e está associada a uma sobrevida média de 2,5 a 3,5 anos.
Métodos
Busca de artigos em inglês no PubMed de estudos sobre fisiopatologia, diagnóstico, tratamento e prognóstico de DPI publicados de 01/01/2010 até 15/01/2024 com 10.728 artigos recuperados. Dos 728 artigos identificados, 115 foram incluídos (38 ensaios clínicos, 7 artigos de revisão, 7 meta-análises, 22 estudos longitudinais e observacionais, 34 estudos transversais e 7 diretrizes/declarações científicas ou documentos de consensos.)
Classificação e Nomenclatura
Com base na etiologia: DPI associada a Doença do tecido conjuntivo (DPI-DTC), Pneumonite de Hipersensibilidade (PH), DPI induzida por medicamentos, DPI pós infecciosas e Pneumonias intersticiais idiopáticas. Essas condições tem características clínicas semelhantes, mas possuem prognóstico e histopatologia distintas. As mais comuns são: Fibrose Pulmonar Idiopática (FPI) (>30% das DPIs), PH (cerca de 15 % das DPI) e DTC (aproximadamente 25% das DPIs).
Epidemiologia
Em 2019, Estudo Global BurdenofDisease = 654.841 pacientes nos EUA tinham DPI (Prevalência de 179,7/100.000 em homens e 218,9/100.000 em mulheres), aumento de 19% em relação a 2010. Prevalência aumenta com a idade com média de diagnóstico 67-72 anos. FPI é mais comum em homens (3:1). Taxas de prevalência de PH nos EUA variam de 1,67 a 2,71 por 100.000, com prevalência igual em homens e mulheres. A prevalência de DPI-DTC varia de acordo com a doença subjacente. 65% de todos os pacientes com ES e 80% dos pacientes com ES cutânea difusa desenvolvem DPI. Dentre as miopatias inflamatórias, 36 % a 45% desenvolvem DPI. 52% a 67% dos pacientes com DMTC, 11 % a 25% dos pacientes com síndrome de Sjogren, 1,5 a 5% das pessoas com AR e aproximadamente 1 a 2 % dos pacientes com LES desenvolvem DPI.FPI e outras DPIs com fibrose pulmonar estão associadas a complicações, como hipertensão pulmonar e câncer de pulmão. Aproximadamente 1/3 dos pacientes com DPI fibrótica apresentam evidências de apneia obstrutiva do sono. Exacerbações agudas relacionam-se com uma piora da sobrevida.
Fisiopatologia
A FPI se desenvolve em indivíduos geneticamente predispostos. Estudos de associação genômica identificaram vários genes associados ao aumento do risco de FPI familiar e esporádica, e outras DPIs fibróticas. A PH é caracterizada por uma resposta granulomatosa imunomediada ao antígeno inalado. As vias biológicas pelos quais as DTC resultam emDPIs são mal compreendidas.Medicamentos também podem precipitar(Bleomicina, amiodarona, nitrofurantoína, imunoterapias contra câncer).
Apresentação Clínica
Dispneia é o principal sintoma das DPIs, inicialmente aos esforços, mas a hipoxemia em repouso é comum com a progressão da doença.Indivíduos com Pneumonite intersticial aguda (Pneumonia em organização e Dano alveolar difuso) apresentam dispneia de início agudo ou subagudo. FPI ou DPI-AR relatam sintomas ao longo de semanas a meses, enquanto aqueles com DPI-ES e PH crônica normalmente relatam sintomas mais indolentes. 30 a 50% dos pacientes com FPI apresentam tosse. Há fadiga e perda de peso, sendo essa> 5% em qualquer momento associa-se a aumento de 2,5 x no risco de mortalidade. A maioria dos pacientes com DPI-DTC são diagnosticados com DTC antes de desenvolver sintomas respiratórios, mas a DI pode ser a primeira manifestação de doença autoimune.
Avaliação e diagnóstico
7 a 42% dos pacientes com fibrose pulmonar tem baqueteamento digital. 93% dos pacientes com FPI e 73% daqueles com DPI-nãoFPI apresentam estertores em velcro nas bases pulmonares. Pacientes com DPI fibrótica em estágio terminal podem apresentar cianose ou hipertensão pulmonar.Testes sorológicos podem sugerir DTC ou PH. A sensibilidade das precipitinas para PH é de aproximadamente 57% a 64%. A TC de tórax tem sensibilidade de 91% e especificidade de 71% para identificar e diagnosticar as DPIs, que por sua vez, estão associadas aos vários padrões histopatológicos; porém, nem a imagem de TC e nem a histopatologia isoladamente são diagnósticas para DPIs específicas. Os quatro padrões histopatológicos mais comuns são: Pneumonia intersticial usual (PIU), Pneumonia intersticial não específica (NSIP), Pneumonia organização (PO) e Dano alveolar difuso (DAD). A abordagem aceita para o diagnóstico de DPI é a avaliação multidisciplinar. A biópsia pulmonar, especialmente a biópsia pulmonar cirúrgica, está associada a uma taxa de mortalidade de 1% a 2%, atualmente menos de 10% dos pacientes com DPIsão submetidos a ela. A Criobiópsia transbrônquica broncoscópica, substituiu a biópsia cirúrgica torácica assistida por vídeo (VATS) com nível semelhante de precisão diagnóstica. Testes de função pulmonar (incluindo capacidade vital forçada [FVC] e DLCO) devem ser obtidos para avaliar a gravidade da doença. Pacientes com DPI geralmente apresentam um padrão restritivo na espirometria. O grau de comprometimento da CVF e da DLCO está associado ao prognóstico. Uma perda de 5% ou mais de CVF está associada a um pior prognósticoem pacientes com FPI, DPI-ES e todas as outras DPIs fibróticas.
Tratamento
No ensaio clínico ASCEND 555 pacientes com FPI randomizados para pirfenidona ou placebo,a pirfenidona reduziu o declínio da CVF em 52 semanas de acompanhamento (declínio de 235 ml vs. 428 ml – diferença relativa de 45,1%). Efeitos adversos mais comuns da pirfenidona: erupção cutânea fotossensível, naúseas e anorexia. No ensaio clínico RELIEF de 127 pacientes com fibrose pulmonar progressiva, a pirfenidona desacelerou o declínio da CVF em comparação com o placebo em 3,53% (IC de 95%, 0,21-6,86). Em um ensaio clínico de 253 pacientes com DPI não classificável randomizados para pirfenidona ou placebo por 6 meses, a pirfenidona reduziu o declínio da CVF em comparação com o placebo (declínio de 17,8 mL vs. declínio de 113,0 mL; diferença entre grupos: 95,3 mL; IC de 95%, 35,9-154,6 mL). Com relação ao Nintedanib,nos ensaios clínicos randomizados, INPULSIS-1 e INPULSIS-2; 1066 pacientes foram randomizados para nintedanib ou placebo. No acompanhamento de 52 semanas, o declínio da CVF foi significativamente menor no grupo nintedanib (114,7 mL vs. 239,9 mL [diferença média: 125,3 mL; IC de 95%, 77,7-172,8 mL; P = 0,001]). No Ensaio clínico SENSCIS de 579 pacientes com DPI associada à esclerose sistêmica (incluindo 48,5% recebendo micofenolato mofetil), nintedanibe reduziu o declínio da CVF em comparação com placebo (−52,4 mL vs −93,3 mL; diferença: 41,0 mL; IC de 95%, 2,9-79 mL). Em uma análise post hoc, os pacientes com a maior redução no declínio anual da CVF estavam recebendo a combinação de nintedanibe e micofenolato de mofetila. NoINBUILD de 663 pacientes com PPF devido a uma causa diferente de FPI, o nintedanibe reduziu significativamente o declínio da CVF em comparação com o placebo, (−80,8 mL vs. −187,8 mL; diferença de 107 mL; 95%IC, 65,4-148,5 mL).
Terapia Imunomoduladora
Nos Ensaios clínicos FaSScinate e Focused de indivíduos com ES cutânea difusa com inflamação ativa, o tocilizumabe não melhorou significativamente o resultado primário de mudança de 48 semanas no Rodnan Skin Score modificado. No FaSScinate de 87 pacientes, o tocilizumabe reduziu o declínio da CVF vs. placebo no acompanhamento de 48 semanas (declínio de 117 mL vs. 237 mL; diferença média de 120 mL; IC de 95%, −23 a 26277). NoFocused de 210 pacientes, o tocilizumabe reduziu o % previsto de declínio da CVF no acompanhamento de 48 semanas (4,6% vs. 0,4%; diferença 4,2%; IC de 95%, 2,0%-6,4%).O Scleroderma lung study 1 randomizou pacientes com DPI-ES para ciclofosfamida oral ou placebo. Aos 12 meses, a ciclofosfamida melhorou significativamente % da CVF prevista em comparação com o placebo (diferença: 2,53%; IC de 95%, 0,28%-5,79%). Scleroderma lung study 2 comparou o micofenolato de mofetil oral (1,5 g – 2x ao dia) com a ciclofosfamida oral em indivíduos com DPI-ES e não encontrou diferença na % prevista da CVF entre os grupos; a CVF % ajustada para linha de base de 24 meses prevista melhorou em 2,19% no grupo de micofenolato de mofetil oral em comparação com 2,88% no grupo de ciclofosfamida (uma diferença entre os grupos de -0,7; IC de 95%, -3,1 a 1,7).Poucos ensaios clínicos foram realizados para pacientes com DPI devido a doenças diferentes de FPI e DPI-ES. Corticosteroides e terapias imunossupressoras como azatioprina e micofenolato mofetil são frequentemente prescritos para tratar PH e DPI-AR, mas nenhum foi testado em ensaio clínico randomizado.Para DPI-AR, dados observacionais sugeriram que rituximabe, abatacepte e tofacitinibe foram associados aos melhores resultados pulmonares, menor incidência de DPI e hospitalizações.
Hipertensão Pulmonar
Poucos tratamentos melhoram os resultados em pacientes com DPI e hipertensão pulmonar. No INCREASERCT de 326 pacientes com DPI e hipertensão pulmonar, o treprostinil, aumentou a distância do teste de caminhada de 6 minutos em 16 semanas por uma média (DP) de 21,08 (5,12) m da linha de base em comparação com um declínio médio (DP) de -10,04 (5,12) m para placebo (diferença média: 31,1 m; IC de 95%, 16,9 a 44,4 m).
Reabilitação pulmonar
Um programa estruturado de educação e treinamento de resistência por 8 a 12 semanas. Uma meta-análise de 2021 de 16 estudos que incluíram 675 pessoas relatou que em indivíduos com falta de ar sintomática devido a DPI, a reabilitação pulmonar foi associada a uma melhora na distância do teste de caminhada de 6 minutos de 40,1 m (IC de 95%, 32,7-47,4 m) em comparação com o controle.
Terapia de suporte
Pacientes com doença pulmonar crônica devem ser vacinados contra pneumococo, COVID-19, vírus sincicial respiratório e influenza, mas nenhum ensaio clínico randomizado foi feito nessa população específica de pacientes para avaliar um potencial efeito protetor dessas vacinas contra exacerbações agudas ou mortalidade. Deve-se desencorajar o tabagismo.A oxigenoterapia de 24 horas é apropriada para pacientes com DPIs que têm saturações de oxigênio em repouso consistentemente menores que 90%.Pirfenidona e Nintedanibe não demonstraram afetar a tosse ou a percepção de falta de ar. Opiáceos de curta ação melhoram a falta de ar. Planejamento de fim de vida e acesso a cuidados paliativos são importantes para indivíduos com DPI e insuficiência respiratória. Diretivas antecipadas fornecem aos pacientes controle sobre seus tratamentos à medida que sua doença progride. Em fase de terminalidade, em que o transplante de pulmão não é uma opção, a intubação e a ventilação mecânica devem ser evitadas porque estão associadas a resultados ruins.
Recomendações de Diretrizes
As diretrizes atuais recomendam: fortemente nintedanibe ou pirfenidona para FPI e fortemente nintedanibe e condicionamente pirfenidona para FPP. Além disso, recomendam fortemente contra azatioprina e corticosteroides em altas doses em indivíduos com FPI. Pacientes devem ser encaminhados para centro especializado no diagnóstico e tratamento de DPI. As diretrizes da ATS para DPI-ES recomendam fortemente o uso de micofenolato mofetil para esses pacientes. Tocilizumabe, nintedanibe, ciclofosfamida,rituximabe e a combinação de micofenolato e nintedanibeestão associados a recomendações positivas condicionais.Recomenda-se que o Treprostinil inalado seja considerado emindivíduos com HP associada à DPI. Recomenda-se que pacientes com PIU devido a qualquer causadevem ser encaminhados para avaliação de transplante de pulmão no diagnóstico. Pacientes com outras formas de DPI, o encaminhamento para avaliação de transplantedeve ocorrer quando a CVF <80% do previsto ou a DLCO<40% do previsto ou se evidência de FPP nos 2 anos anteriores.
Prognóstico
A sobrevida média para indivíduos com FPI é de 3 a 3,5 anos; um maior declínio na CVF associa-se ao maior risco de mortalidade.A desaceleração do declínio de CVF com pirfenidona ou nintedanibe foi associada a uma expectativa de vida melhorada de cerca de 1 a 2,5 anos.
Limitações
As limitações da revisão são: não foi uma revisão sistemática, não foi realizada uma avaliação formal da qualidade da literatura, foram limitados apenas artigos em inglês, não foram discutidas todas as DPIs, alguns artigos relevantes podem ter sido perdidos.
Conclusões
A DPI se apresenta com dispneia ao esforço e pode progredir para insuficiência respiratória. A terapia de primeira linha é nintedanibe ou pirfenidona para FPI e micofenolato mofetil para DPI-DTC. O transplante de pulmão deve ser considerado para pacientes com DPI avançada. O treinamento físico melhora a distância do teste de caminhada de 6 minutos e a qualidade de vida.
Referência
Maher TM. Interstitial Lung Disease: A Review. JAMA. 2024 May 21;331(19):1655-1665. doi: 10.1001/jama.2024.3669. PMID: 38648021.
Dra. Isabela Medeiros – Pneumologista pela UFF